PORQUÊ O DIA 8 DE MARÇO
Neste dia, do ano de 1857, as operárias têxteis de uma fábrica de Nova Iorque entraram em greve, ocupando a fábrica, para reivindicarem a redução de um horário de mais de 16 horas por dia para 10 horas. Estas operárias que, nas suas 16 horas, recebiam menos de um terço do salário dos homens, foram fechadas na fábrica onde, entretanto, se declarara um incêndio, e cerca de 130 mulheres morreram queimadas. Em 1910, numa conferência internacional de mulheres realizada na Dinamarca, foi decidido, em homenagem àquelas mulheres, comemorar o 8 de Março como "Dia Internacional da Mulher". De então para cá o movimento a favor da emancipação da mulher tem tomado forma, tanto em Portugal como no resto do mundo.
O QUE SE PRETENDE COM A CELEBRAÇÃO DESTE DIA
Comemora-se no dia 8 de Março de 2010 o Dia Internacional da Mulher. Vários têm sido os sinais de emancipação feminina ao longo dos tempos que terão contribuído, por certo, para a actual condição social da mulher.
Ao assinalar este dia pretendo chamar a atenção para o papel e a dignidade da mulher e levar a uma tomada de consciência do valor da pessoa, perceber o seu papel na sociedade.
Neste dia devemos homenagear as mulheres, que incansavelmente defendem, organizam e se mobilizam para manterem a igualdade de sexos em permanente discussão social.
Apesar dos avanços a nível de diplomas legislativos ao nível de atitudes e das mentalidades, a mulher continua, na prática, a ter de enfrentar um conjunto de situações que urge alterar.
A Escola pode instituir boas práticas para a igualdade de homens e de mulheres ao nível da linguagem e da comunicação contribuindo para promover uma revisão crítica dos curricula escolares, manuais e outros materiais de educação, a todos os níveis, de modo a apoiar formas de fortalecer a promoção da igualdade envolvendo tanto rapazes como das raparigas na Escola.
Com efeito, segundo Rêgo, 2005:
“ - A promoção da igualdade entre os homens e as mulheres é uma das tarefas fundamentais do Estado nos termos do artigo 9.o alínea h) da Constituição;
- O direito à identidade pessoal goza protecção constitucional no âmbito dos Direitos, Liberdades e Garantias - artigo 26º nº 1 - e o sexo é o primeiro factor da identidade individual;
- A Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, em que Portugal é parte desde 1980, refere no seu artigo 5º, alínea a) que “os Estados Parte tomam todas as medidas apropriadas para modificar os esquemas e modelos de comportamento sociocultural dos homens e das mulheres com vista a alcançar a eliminação dos preconceitos e das práticas costumeiras, ou de qualquer outro tipo, que se fundem na ideia de inferioridade ou de superioridade de um ou de outro sexo ou de um papel estereotipado dos homens e das mulheres”;
- A UNESCO aprovou Resoluções em 1987 e 1989, no sentido da adopção de "uma política destinada a evitar, na medida do possível, o emprego de termos relativos explícita ou implicitamente a um dos sexos, salvo se se tratar de medidas positivas em favor das mulheres" e de "continuar a elaborar directrizes sobre o emprego de um vocabulário que se refira explicitamente à mulher e a promover o uso dessas directrizes nos Estados Membros", bem como "a zelar pelo respeito dessas directrizes em todas as comunicações, publicações documentos da Organização";
- O Conselho da Europa aprovou em 1990 uma Recomendação aos Estados membros no sentido do emprego de uma linguagem que reflicta o princípio da igualdade entre os homens e as mulheres.”
Ainda segundo Rêgo, “na linguagem e no que se refere aos seres humanos, é comum o uso exclusivo do masculino para designar o conjunto do género masculino e do género feminino, ainda que morfologicamente exista feminino. Admite-se sem dificuldade que o masculino 'engloba' o feminino. É o caso da utilização da expressão 'o Homem' - com maiúscula - como 'sinónimo' de 'a Humanidade'. Identificam-se os homens com a universalidade dos seres humanos. A parte adquire valor de todo. E o masculino é, para além de si próprio, também neutro.”
Rêgo promove um Guia de Boas Práticas no uso da linguagem para a igualdade entre mulheres e homens, que podemos adoptar na Escola:
Preâmbulo
“Na linguagem e no que se refere aos seres humanos, é comum o uso exclusivo do masculino para designar o conjunto do género masculino e do género feminino, ainda que morfologicamente exista feminino.
Admite-se sem dificuldade que o masculino 'engloba' o feminino. É o caso da utilização da expressão 'o Homem' - com maiúscula - como 'sinónimo' de 'a Humanidade'. Identificam-se os homens com a universalidade dos seres humanos. A parte adquire valor de todo. E o masculino é, para além de si próprio, também neutro.
Evidenciando a incorrecção substancial do masculino genérico, atente-se na seguinte frase: "Marido e mulher ambos são bons homens", enfim, posto que muitas desproporções ou dissemelhanças se cometem na nossa língua...
Fernão de Oliveira, Gramática da linguagem portuguesa, Cap. XLIX, p. 1536.
Já o nosso primeiro gramático apontou que o uso do masculino genérico pode gerar o cometimento de muitas desproporções ou dissemelhanças...
As desproporções e dissemelhanças de um ponto de vista androcêntrico encontram expressão privilegiada na estruturação assimétrica das propriedades de sexo e de humanidade que caracteriza o sistema gramatical de género, em que o género geral (dito masculino) se opõe a um género específico (dito feminino). Da dupla função (genérica e específica) dos termos que se referem aos homens resulta que homem surja como medida do humano, como norma ou ponto de referência. Subsumidas na referência linguística aos homens, as mulheres tornam-se praticamente invisíveis na linguagem; quando visíveis, continuam marcadas por uma assimetria que as encerra numa especificidade (uma "diferença") natural (o sexo) ( numa 'humanidade' de um outro tipo. Quando considerado a um nível socio-cognitivo, este sistema de género é o modelo, inscrito na língua, de uma categorização, que, com base em critérios biológicos, exclui as fêmeas humanas da humanidade, do humano geral. 0 sexismo na linguagem é assim outra coisa, e bastante mais grave, do que a simples “pejoração' ou uma mera sub-representação linguística das mulheres. (Míchard, 1991, 147-58).
Neste contexto, é interessante comparar o primeiro 'significado' da acepção específica de homem com mulher, nas entradas de homem/mulher - no Grande Dicionário de Língua Portuguesa, coordenação de José Pedro Machado (para a Sociedade de Língua Portuguesa), 6 vol.s, Edição para o Círculo de Leitores, Lisboa, 1991.
Assim:
'Homem, s.m. (do lat. Homine-). Cada um dos representantes da espécie humana, animal racional; 0 ser humano do sexo masculino (opõe-se a mulher). (vol. III, p.254)
'Mulher, s.i. (do lat. Muliere-). A fêmea da espécie humana; pessoa do sexo feminino, depois da puberdade. // … (vol. IV, p.245)
Ou seja, os homens têm sexo (propriedade acessória); as mulheres são um sexo (propriedade essencial).
As práticas linguísticas devem ser congruentes com as novas práticas sociais, reflectindo-as, dando dele testemunho e promovendo o seu desenvolvimento. Verifica-se assim a necessidade de adequar as práticas linguísticas à situação histórica e cultural portuguesa de hoje e a uma nova geração de políticas públicas para a promoção da igualdade entre homens e mulheres.”
http://www.eselx.ipl.pt/ciencias-sociais/Temas/direitos_mulher/; Consultado em 02.03.2010.
http://www igualdade.gov.pt. Consultado em 02.03.2010.Rêgo, M. C. C., Igualdade de género: o estado da arte in Grupo de Trabalho Temático Igualdade de Oportunidades, QCA III, Lisboa, 28.02.2005.
Jorge Sá- Formador de CE